Notas de uma mente inquieta

A revolução dos bichos

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Estava eu andando por um shopping qualquer quando me deparei com aquela feirinha de livros baratos. Aqui e acolá encontro algum achado interessante, então sempre gasto alguns minutinhos procurando com cautela. Venho percebendo ultimamente que eles têm sortido com clássicos da literatura a preços super acessíveis, nessa oportunidade pego aqueles já li anteriormente e não tenho a versão física, até que me deparo com alguns clássicos que nunca li, como foi o caso d'A revolução dos bichos.

Como todo clássico, acho que já paira no imaginário cultural do que se trata a história. Tem uma máxima que eu sempre tento evitar "a gente nunca aprende aquilo que ACHA que sabe", então ignorei o que já (achava que)sabia e fui atrás entender os meandros desta famosa fábula. Livro curtinho de leitura fácil, quem também ainda não leu já coloca na fila e não vai se arrepender.

Sei que não tem como descaracterizar as críticas do Orwell ao debate político do século passado. É importante captar, absorver, digerir, ruminar esse detalhe, mas não acho que devamos limitar a mensagem apenas a dicotomia capitalismo/comunismo. Pelo menos foi com estes olhos que tentei interpretar as mensagens ali abstraídas. Como já citei em postagem passada o tempo tem o poder de alterar os signos e o significados.

Nosso trabalho prepara o solo, nosso esterco o fertiliza, e ainda assim não há um de nós que tenha mais do que a própria pele como posse.
Tyler Durden, ou pelo menos poderia ter sido.

Ter lido 1984 antes d'A revolução nos faz entender que as ideias que o Orwell iria trazer com mais profundidade na obra seguinte já estavam germinando ali atrás. A ideia de quem controla o presente controla o passado fica bem desenhada na constante alteração dos mandamentos. A proclamação de um inimigo em comum aqui incorporado pelo Bola-de-Neve ou a utopia que nos faz diariamente continuar servindo como o Moinho de vento. Ver o líder de movimentos "anti-corrupção" se tornarem aquilo que tanto bradavam contra virou rotina nos cadernos de política. É evidente o porquê deste livro ainda ser tão relevante nos dias de hoje, a mensagem continua conversando com os trabalhadores do mundo todo. As promessas que Bola-de-Neve fez, melhores condições de vida e menos dias de trabalho, em 1945 ainda são pauta na câmara dos deputados brasileira 80 anos depois.

De algum modo, parecia que a fazenda enriquecera sem fazer os animais em si mais ricos.

Tem uma passagem no livro Homo-Deus (ando citando muito ele ultimamente) que o Harari inicia falando da revolução ~dos bichos~ industrial onde tivemos a troca do uso dos cavalos pelos carros. Com isso a população de cavalos diminuiu no mundo pois perdeu sua "utilidade". No fim, ele argumenta que na revolução da inteligência artificial, o ser humano é o cavalo da analogia anterior. Ele que vai ser substituído por uma máquina. Assim como o Moinho de Vento que foi construído com muito suor e trabalho pelos cavalos da fábula, essa tecnologia poderia ser usada para trabalharmos menos mas o final do conto não é tão bonito quanto o idealizado.

[...] o sonho do oprimido é ser o opressor.

Terminei o livro com um sentimento muito parecido com o 1984. Ele é de um pessimismo apático, nos faz questionar se realmente existe alguma alternativa para a perversidade da sociedade. Aos olhos do tempo, perceber que aquele final da distopia continua real, o poder concentrado na mão de poucos e a passividade da sociedade nos levará para o mesmo fim da derrota. Fiquei me perguntando o que nesta história poderia ter levado a um final diferente, o que os bichos poderiam ter feito para evitar terem sido novamente escravizados? A frase completa do Paulo Freire é: “Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor”. Paulo Freire este reconhecido mundialmente por suas políticas de alfabetização de adultos. Olhando para a história isso acontece, certo? Com a expulsão do Sr. Jones apenas os Porcos se alfabetizam. Eles centralizam a arte da leitura e escrita e a partir desses apetrechos político-burocráticos subjugam os outros animais. Seria a educação a resposta para a pergunta final?

P.S.: Tem uma poesia em eu ter terminado esta leitura no dia do trabalhador que ainda não captei.

#leituras #livros #review