Arcane
Quando assisti Arcane pela primeira vez em 2021, assisti com nariz torcido porque nunca gostei de LOL. Filmes e séries de jogos também não tinham uma fama muito boa, logo, supernormal não criarmos qualquer expectativa. Mas, ledo engano, os 3 primeiros episódios que foram lançados me pegaram de jeito. O final do 3o episódio é algo antológico.
É esteticamente deslumbrante.
A animação 3d(comercial) passou por um amadurecimento muito significativo na última década. Saiu de renders com um aspecto matemático, com shaders buscando meramente o realismo para algo mais refinado artisticamente. Inclusive, com intervenções 2d em sua pós-produção. Arcane, na temporada de estreia, apresentou mais uma vertente deste amadurecimento com inspirações de movimentos artísticos clássicos como Art Noveau, a influência do moderno e urbano, como o grafite.
Foi narrativamente intrigante.
A trama nasce a partir de um jogo onde temos muitos personagens jogáveis sem nenhum protagonista. A combinação dos personagens(e seus respectivos jogadores) em um MOBA molda o navegar da partida. Ao assistir Arcane pela primeira vez senti a mesma coisa, a cada novo personagem adicionado as possibilidades se transformam. Quando um personagem muda de lado, ou se alia a um novo grupo, a história adapta-se completamente. Obviamente, existe um núcleo principal rodeando a Violet e a Powder, mas isso colabora para ao conceito apresentado, que são as dicotomias ideológicas.
A lindeza da construção narrativa está na apresentação destas nuances a partir destas perspectivas conflitantes: ciência ou magia? guerra ou diplomacia? amor romântico ou amor fraternal? a cautela da experiência ou a ousadia da juventude? Ladoalto ou Subferia?
Aí que mora a beleza desta obra, o maniqueísmo é o que move a trama mas não existe resposta para as dualidades.
A primeira temporada se encerra com isto posto a mesa: Jynx ou Powder? E como a mesma diz:
"Um brinde a mudança"
Iniciamos a segunda temporada em uma busca pelo posicionamento da força ante o terror. Parece sempre ser a solução esperada da nossa espécie a arquitetura da Guerra em busca da Paz, ou como disse o Viktor:
"A razão se choca com a emoção: esta é a contradição autodestrutiva da natureza humana"
Nos aspectos técnicos a série mantém esplendidamente o padrão elevado. Entende-se os grande acertos da primeira temporada, em termos de arte se explora horizontalmente outros estilos: temos cenas em aquarela e recortes. A trilha sonora é um arregaço! Na segunda temporada foi utilizada de maneira muito mais assertiva na escalada de tensão usando como mecanismo as trilhas. Sendo pra mim, o ápice disso o encerramento da história ao som de "Wasteland" cantando Please, let me go. Gostei também da ousadia de adicionar Rock japonês, pop chinês, rap francês, etc. Arcane já tinha se proposto visualmente de maneira cosmopolita, agora foi de maneira auditiva também muito bem representada. Pô, se entrasse um Funk BR seria muito foda, ein?! Então, temos a combinação majestosa do audio com o visual e suas danças entre o moderno e o clássico.
Um ponto muito importante em se falar do enredo de Arcane é como as personagens femininas são fortes! Temos vertentes de personalidade muito distintas apresentadas de belíssimas formas. A general Ambessa ganha um destaque extraordinário na segunda temporada, construindo um dos personagens mas badass da cultura pop nos últimos tempos. Acho esse ponto muito significativo em um meio lotado de incel e misógino como é o mundo dos games online.
Não sei como foi a experiência para quem conhece muito bem a lore de LOL, mas fiquei encantado pela variação de características estéticas dos personagens: a Caitlyn de comandante, a Vi de polícia, a versão da Powder sem ter surtado, são visualmente muito bem concebidos. Inclusive, neste aspecto da mudança de personagens, não faço ideia do que é realmente parte da base de cada um para o jogo. O Jayce oficial é a versão "garoto do progresso" ou "malucão do machado mágico"? Deu vontade de jogar só pra entender isso... mas passou rápido 😝
Também admirei bastante a ousadia dos roteiristas em, um espírito de RR Martin, matarem alguns personagens importantes da série. Acho que as mortes do Vander e do Silco são extremamente significativas pro enredo. Também enxergo um paralelo interessante com as Crônicas de Gelo e Fogo onde a magia no mundo vai se apresentando paulatinamente. Onde o arcano inicia-se como apenas histórias de um passado longínquo para parte da vida das pessoas até um ascendente onde domina o poder, a política, e pode consumir tudo de dentro pra fora.
No episódio final, tenta-se resolver as dicotomias através do enfrentamento direto de ideias e não apenas metaforicamente. Nada mais visual para uma história baseada em um jogo do que essas dualidades entre os antagonistas se resolverem em um PvP.
Pra mim, sem exagero algum, Arcane é uma das melhores obras audiovisuais da década! Achei um acerto não esticarem mais a história além destas duas temporadas. Também seria horrível se tentassem trazer para live-action. Quer continuar aproveitando o hype (merecido) da obra? Contem novas histórias.