Notas de uma mente inquieta

Pecadores

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Esse é uma daquelas obras que é muito difícil descrever sem acabar tropeçando em algum spoiler, então se você é do tipo que se importa mas quer saber se vale a pena dar uma chance: eu super recomendo! Inclusive, procura assistir com o mínimo de informação possível e garanto que irá se surpreender.

🚨 Área com spoilers 🚨

Não tem como imediatamente não relacionar com dois clássicos do Tarantino: Drink no Inferno e Django Livre. A estrutura em si já remete as obras do Quentin com essa ideia de misturar estilos e histórias formando algo muito maior. Quantas vezes já vimos a história do artista rebelde que resolve confrontar os pais conservadores? Ou daquele selfmade-man que volta para a cidade natal mostrar o que aprendeu na cidade grande. Ou a alegoria do período segregacionista estadunidense. Agora fazer tudo isto com uma história de vampiros caçadores é divertido demais.

Além dessa mistura de gêneros, o diretor se permite brincar com vários aspectos do cinema: proporção do enquadramento, trilha sonora sobreposta, até mesmo o belíssimo plano-sequência com expressões artísticas negras de diferentes eras. Tem ares de clássicos com uma execução modernista, feito que apenas quem domina todos os aspectos do cinema consegue entregar.

As atuações também são muito boas. Obviamente, o destaque vai ser para o Michael B. Jordan interpretando dois irmãos gêmeos mas, pra mim, o Miles Caton roubou a cena. É o menino ingênuo que carrega o violão como sua arma contra o mal.

Recentemente, li uma recomendação de livro que me trouxe reflexões sobre como na América Latina entende essas misturas de uma maneira mais natural do que Hollywood, todo o gênero do Realismo Mágico nasce dessa premissa.

Enquanto em uma história tradicional de Hollywood, coisas sobrenaturais são vistas com espanto e “do demonho”, nas histórias latinas, estes fenômenos são vistos como parte da vida. Meu exemplo preferido é uma cena da série de “Cem anos” na Netflix, onde o Amaranta, ainda bebê, usa poderes de telecinese para levitar seu berço. Nos EUA, isso logo viraria “a bebê do maaal”, mas na Colômbia mágica, seu pai só baixa o berço com a mão, mal desviando o olhar do que estava fazendo. “São as propriedades da matéria. Nada extraordinário.”

E essa quebra de expectativa foi o que mais me divertiu neste filme. Isso e a trilha sonora. Confesso que até fiquei imaginando como poderia ser uma série neste mesmo universo.

Sobre as alegorias e subtextos, o que eu mais gostei foi o discurso dos vampiros sobre eles serem seres livres e querem apenas trazer a liberdade para o mundo, o que em um mundo ainda segregado pela escravização dos seus pares, sempre vai vir com a pergunta: a que preço? será se é realmente liberdade? Ou como canta o Emicida:

Existem mil formas de prisão
Mas só uma de liberdade

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