Notas de uma mente inquieta

The Pitt

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Já vou adiantando que provavelmente essa é uma das melhores séries de 2025. A história se passa durante um plantão no hospital escola de Pittsburg e seus episódios são divididos em intervalos de 1h deste plantão. Sim, a temporada inteira se passa em um intervalo de 15h e isso é muito divertido, como eu falei na postagem sobre a série Adolescência é legal ver a galera inovando no formato da entrega. Você pode estar pensando em como isso pode deixar tudo muito superficial com tão pouco tempo para explorar os personagens mas aí que está parte da diversão, acontece muuuuita coisa no plantão de uma emergência. Neste plantão da temporada então é extremamente caótico, se você já notou eu disse que são 15h de duração e normalmente um plantão leva 12h, logo, temos uma surpresinha no final.

Logo de cara, no primeiro episódio é estabelecido um respeito pelo protagonista da série, Robby, um médico experiente que irá liderar aquele plantão em questão. Inicialmente já sabemos que ele está passando por uma batalha emocional importante. Como seus colegas de trabalho temos toda a equipe do Hospital: médicos residentes, enfermeiros, assistente social, gerência, faxineiros e estudantes. Sim, estudantes de medicina que irão colocar em prática tudo aquilo pela primeira vez, o que contribui bastante para evolução das tramas, pois assim, de certa maneira, eles fazem o papel dos espectadores, onde vão aprender sobre a dinâmica particular daquela emergência.

A variação de intempéries que rola é surreal, deixando todo episódio pura adrenalina. Variando de cenas hilárias a reflexões emocionantes, por exemplo: quando alguém morre em uma emergência abarrotada de atendimentos, quando é negligência e quando é parte do ofício? Se essa mesma morte acontece na supervisão de um estudante, o quanto ele deverá se sentir culpado?

A série se mostra muito responsável com diversos temas: doação de orgãos, vacinas, aborto, epidemia de fentanil, paramédicos dos EUA, sem soar demasiadamente educacional. Tudo é introduzido dinamicamente na narrativa e como tem muita coisa acontecendo ao mesmo tempo é bonitamente introduzido nestes meandros. A dinâmica entre os colegas de trabalho também é um estudo de roteiro a parte. Explorar os vínculos entre os personagens e desenvolver suas profundidades requer tempo. Muitas séries levam temporadas inteiras para espalhar isso pelo tempo cronológico da trama, mas aqui eles não tem isso, tudo precisa ser resolvido ainda naquele dia. Diálogo a diálogo, paciente por paciente.

Ter o Robby como personagem principal dá o tom da série, uma pessoa com muito conhecimento e experiência, respeitado por seus pares que está batalhando com suas memórias tentando manter sempre o profissionalismo e serenidade. Calmo como uma bomba. E essa angústia chega quase a se solidificar no ar nos últimos episódios, mérito de um roteiro muito bem construído.

"Não sei quantas pessoas eu ajudei hoje mas sei exatamente quantas morreram"

A série inteira é desenhada conceitualmente sobre ciclos, sobre o início e fim das interações: intervalos, plantões, pacientes, chegadas de calouros, partidas de veteranos, nascimentos e a morte. E isso é apresentado em todos os aspectos audiovisuais da obra, desde textos motivacionais a enquadramentos.

Uma série belíssima sobre a importância da medicina, em seu mais amplo conceito, para a sociedade. Espero fortemente que tenha continuação.

🚨 Área com spoilers 🚨

Achei a construção narrativa do atentado terrorista muito bem escrita, o rapaz com a lista de meninas é apresentado no primeiro episódio de maneira que alguns pessoas poderiam até dar pouca importância a situação. Interessante como é a segunda série de alta audiência tocar nesse assunto esse ano. Imaginando que essas produções iniciaram 2 a 3 anos atrás, conseguiram pegar o tema em um momento de ápice para discussão.

O Robby quebrando com a morte da menina foi bem impactante, apesar de atuação não ser lá essas coisas. Ele tentou ao máximo manter a serenidade que a profissão exige mas não deve ser nada fácil ver alguém próximo morrer nas suas mãos.

Como mencionei antes, achei legal a maneira como eles abordaram alguns assuntos científicos "polêmicos", mas por outro lado achei meio forçado como alguns outros foram apresentados. Tipo, estudante de medicina que não tem onde morar parece algo meio distópico no Brasil. Ou o respeito magnânimo pelos profissionais de enfermagem. A unanimidade dos profissionais de saúde em defesa da ciência. Entendo que eles não podem gerar dúvidas sobre a visão profissional dos personagens para o público de maneira que gere na cabeça dos bitolados aquele "viu?! não é unânime", mas em tempos de médicos publicamente indicando ivermectina na pandemia mudou drasticamente minha visão dessa unanimidade.

Tem uma dubiedade na maneira que foi apresentada a personalidade da Dr. Santos que me incomodou muito. Beleza que ela conseguiu pegar o médico babaca que roubava remédios mas acho que ela foi, em diversas atuações, muito anti-profissional. No meu entendimento, por mais que em suas ações arriscadas ela tenha obtido sucesso, o ato de arriscar a vida de um paciente sem a qualificação adequada já é motivo suficiente para ela ser demitida no primeiro dia. Os fins não justificam os meios. Dito isto, ela é uma excelente personagem e deu uma dose de caos a mais para a temporada.

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